segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Loucuras e manias...

   
    Ontem(02/110), do nada, ouviu-se um estrondo enorme, daqueles em que a gente pensa que é o mundo que está se acabando de vez, por que aos poucos nós já estamos acabando com ele. Mas era apenas um raio que fez a energia elétrica acabar no bairro inteiro.
    Estava assistindo o jogo do meu time pelo campeonato brasileiro. O jogo estava duro, mas duro de ver de tão ruim que estava... 
   O placar também era a nota da partida: 0 para ambos os lados. Nenhum lance de perigo, aquela monotonia que não faz dormir somente os fanáticos por futebol. O silêncio predominava no meu humilde quartinho. Aí os pensamentos e paranoias invadiram a minha mente: "será que alguém irá fazer gol enquanto eu não estiver assistindo? Se o meu time fizer gol é por que sou pé frio mesmo, mas se acabar sofrendo um gol é por que não posso deixar de assistir o jogo, caso contrário meu time acabará perdendo a partida".  
 A energia voltou. E não é que o meu time acabou levando um gol? Por um momento cheguei a pensar que era pé quente realmente e que não poderia deixar de assistir os outros jogos no restante do campeonato. Cheguei na loucura de pensar que os jogadores ouviam o que eu estava pensando e que precisavam do meu apoio. 
   Mas como nos últimos anos meu time anda sempre dando vexame, o meu sentimento atual de que sou realmente o pé frio e responsável pela má fase. Quase todo jogo que assisto o time empata ou perde. Fico o tempo todo ligado na tela, às vezes me pego dando um chute quando o atacante está na cara do gol. No final da partida parece que estou até mais cansado do que alguns jogadores... 
    Mas e os jogos que assisti e ele foi campeão? Essa dúvida cruel vive em minha mente, mas me lembro que no início nem era uma dúvida, tinha a plena convicção de que não poderia deixar de jeito nenhum de assistir ou ouvir um jogo do meu time. 
      E isso vem desde pequeno. Por isso que digo que meio que nasci com a esquizofrenia, pois esse transtorno não é somente surto psicótico. Ela é formada por inúmeros componentes, e algumas manias, delírios e pensamentos fazem parte dessa maledita esquizofrenia. 
    Lembro-me que, quando tinha uns 11 anos de idade fui ao Mineirão, para assistir um jogo do atlético-MG, a convite de um colega meu. Não queria ir, pois o jogo do meu time (ninguém sabe qual é) também iria ser no mesmo horário. Iria ouvir pelo rádio antigo valvulado que tinha lá em casa. Sempre fui uma criança curiosa, e um dia comecei a fuçar naquele rádio enorme de madeira para tentar achar alguma emissora de rádio do Rio de Janeiro. O rádio tinha sete faixas, pegava rádio dos Estados Unidos, do Japão, dava para ouvir gente falando algo parecido com árabe... Então por que não pegaria rádio do Rio? Fiquei mexendo naqueles botões até conseguir achar uma emissora do Rio de Janeiro e assim poder ouvir os jogos do meu time. 
    De dia tinha que ficar com a mão segurando o cabinho da antena, para pegar melhor. Pois AM tem essas dificuldades, como montanhas, clima, etc... Só sei que de noite pegava que era uma beleza...
    Mas, voltando ao jogo no Mineirão, resolvi aceitar o convite, afinal jogo no rádio tem quase todo dia... E também iria sair um pouco de casa, me divertir. 
ouvia os jogos do meu time em um rádio igual à esse..
    O mineirão estava lotado, todo mundo espremido, na época não havia as cadeiras nas arquibancadas. Era tudo cimento mesmo. E o atlético ganhando o jogo, todo mundo feliz, menos eu, que estava de ouvidos atentos. De repente, o serviço de auto falantes do estádio anuncia que o meu time estava perdendo o jogo por 2x0... Fiquei surpreso no início, pois nem haviam anunciado o primeiro gol do time adversário... Mas logo comecei a chorar. Chorei tanto que o pessoal do lado ficou preocupado e perguntou o motivo daquele chororô todo...
     E a besta do meu colega disse a verdade, apesar de saber que o meu time é um grande rival do atlético MG. Falou com todas as palavras o nome do time, mas, ainda bem que naquela época as coisas eram mais brandas e não me expulsaram do estádio. Alguns até acharam engraçado. O mais engraçado é que, segundos depois, o locutor do estádio se retratou e disse que era o meu time que estava ganhando de 2x0. Senti um alivio enorme e a minha consciência ficou mais leve, não iria sofrer o castigo por ter abandonado o meu time, justo em um clássico importante. Mas entendi que aquele erro do locutor era um aviso para nunca mais deixar de acompanhar o meu time, seja pelo rádio ou pela televisão... 
    E por uma época o time passou por uma fase boa, ganhando vários campeonatos, inclusive um mundial... Mas ultimamente as derrotas e os empates são mais frequentes e a dúvida às vezes chega a ser uma certeza de que sou o pé frio mesmo. 
  E fico nesse debate interno que parece não ter fim, mas  futebol é assim mesmo: um dia ganha outro perde. Seria muito sem graça se somente o nosso time ganhasse tudo né? 
   
alguém poderia me dizer que golpe é esse?
    E alguns jogadores do meu time não são muito bons (só do meu time?), apesar do alto salário que recebem. Alguns jogam apenas com o nome, sendo que o principal deles chega a receber 950 mil reais por mês... 
   Antigamente chegava a chorar com a derrota, mas hoje em dia nem ligo tanto, acho que por causa do embotamento afetivo. Pelo menos para uma coisa me serviu essa maledita esquizofrenia. Meu time perdeu a final da copa do Brasil deste ano (estava assistindo até os penaltys, apesar de achar que sou o pé frio e culpado de tudo...). Mas no dia seguinte segui a minha vida normalmente, pois os jogadores foram descansar e dormir no melhor hotel de Belo Horizonte e eu aqui continuo na minha humilde residência. Fico triste pelos outros torcedores, mas nem tanto pelos jogadores, que beijam o escudo de um time e depois do outro no mês seguinte.
   Mas almocei normalmente, ao contrário de antigamente, que dava vontade até de sumir deste mundo quando perdia um campeonato. E vida que segue, me sentindo cada vez mais uma pessoa normal, ao ver essa loucura toda em que se transformou nosso mundo... 

-Obs: gostaria de agradecer uma pessoa que me ajudou mas não se identificou. Geralmente quando as pessoas me ajudam me enviam um email. Mas como essa pessoa preferiu não se identificar resolvi agradecer aqui pelo blog. 

11 comentários:

  1. Olá gostaria de saber se você tem um e-mail para que eu possa entrar em contato porque tenho tantas dúvidas e sei que com sua experiência e conhecimento pode me ajudar, fiquei bastante feliz ao encontrar esse blog tenho lido bastante sobre a esquizofrenia.

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    1. Olá
      Tem um livro que se chama "Entendendo a esquizofrenia" que eu indico muito, pois tem uma linguagem simples e objetiva. Neste link você pode baixar esse e outros livros sobre o assunto. Em relação as suas dúvidas, procuro nas postagens falar de uma maneira também simples sobre o assunto.
      https://drive.google.com/drive/folders/0B1dxTb_oy7qwUW5oNTl4YnRkTE0

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    2. Obrigada, poderia falar um pouco mais a respeito do surto? A questão de lembrar depois os detalhes,da agressividade, porque depois do acontecido ele se faz de vitima? E com relação a apatia hoje ama de mais amanhã finge que nem conhece?

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    3. Olá
      Em relação ao fato das lembranças do surto, no meu caso em particular me lembro bem do que ocorreu, o esquecimento ocorre por causa do tempo mesmo e também acho que pelo fato de usar o diazepan. Me lembrava tão bem que até escrevi um livro em que narro os meus surtos psicóticos.
      Em relação a agressividade, cada pessoa tem a sua maneira de ser e reagir, nem todos são agressivos. Não existe "o esquizofrênico" e sim a pessoa que tem esquizofrenia (já até copiaram essa minha definição) e que tem suas qualidades e defeitos.
      Em relação a apatia acredito que seja um pouco pela variação de humor mesmo, no meu caso muda bastante.
      Abaixo o link sobre como adquirir o livro que escrevi "Mente Dividida"
      http://memoriasdeumesquizofrenico.blogspot.com.br/2012/08/mente-divida-memorias-de-um.html

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    4. Obrigada estou vendo os livros que me mandou o link anteriormente irei ler esse tambem. Me expressei errado com relação a agressividade é que estava namorando um rapaz que aparentemente tem a esquizofrenia já foi em consultas, fazia uso de haldol mas não tem consciência da doença e esta pessoa era agressiva. nos últimos dois meses tenho me empenhado bastante a conhecer mais a respeito da esquizofrenia acho que quem convive assim como quem tem precisa entender o que acontece E o seu blog tem me ajudado bastante obrigada

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  2. Muito corajoso o seu blog. Digo isso porque ainda sinto um estigma e não sei como explicar para as pessoas o que acontece comigo.
    Ainda não há um diagnóstico fechado pra mim. Tenho cid 10 f-29, mas estou em observação. Nunca fiquei internada.
    Tive delírios, alucinações, achei que meu celular havia sido clonado e as pessoas com quem eu conversava pelo whatsapp não eram elas mesmas. Achei que tinha um drone em volta da minha casa me observando e querendo me matar.
    Achei que a minha linha telefonica estava interceptada, enfim... foram muitas coisas.
    Agradeço pela criação deste blog pata eu ver relatos de que essas coisas não acontecem só comigo.
    Tomei risperidona, mas me causou amenorréia, entao troquei pro aristab 30 mg.
    Na ultima vez em que estive no trabalho tomei 20 comprimidos de calmante (por sorye, fitoterapicos) e só de pensar em voltar preciso tomar rivotril.

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    1. Nao sei se meu comentario foi bom ou ruim. Chamar o blog de corajoso, uma vez que voce é um guerreiro contra o estigma, talvez coragem nao tenha sido a palavra mais adequada.O importante é aceitar as pessoas nas suas diferenças. Sou eu que tenho um problema em explicar para as pessoas que tive um surto psicótico,as alucinações, tenho medo de como serei vista, mas acompanho o seu blog, que dá forças para muita gente. Te desejo muita saúde!

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    2. Olá
      Na verdade você não tem problemas em explicar, infelizmente o preconceito é muito grande e isso realmente é mais uma questão de sobrevivência mesmo.
      No meu caso como sempre gostei de ficar sozinho não teve problema nenhum em assumir a minha condição, ainda mais pelo fato de não estar mais no mercado de trabalho.
      Sinceramente não recomendaria a ninguém a fazer o mesmo se ainda estiver no mercado de trabalho, por questões de sobrevivência mesmo.
      Obrigado pela participação e não se culpe por esta situação.

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    3. Você escreve bem, se expressa bem, é uma prova de que as limitações podem ser superadas e as pessoas deveriam ser aceitas nas suas diferenças. O preconceito é real, mas ninguém tem culpa de ficar doente. A maneira de como isso é visto deveria mudar.
      Uma pergunta: os delírios e as alucinações costumam mesmo parar com os medicamentos?
      Minha médica diz que a pessoa com transtorno esquizoafetivo (que pode ser o meu caso), não costuma voltar atrás (com medicamento) e pensar: como fui capaz de imaginar que tinha um drone em volta de casa? Normalmente, as crenças continuam.
      É comum reconhecer que os delírios eram delírios?
      Quanto às alucinações, continuo acreditando que vi o que vi, mesmo jamais encontrando os papéis e por estar com esse problema, acreditar que eram prováveis alucinações.
      É comum o discernimento depois que o surto passa?

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    4. Olá
      Em relação aos medicamentos, tudo depende da gravidade do caso e também da qualidade do atendimento que o paciente recebe.
      No meu caso em particular as alucinações paravam, mas também ficava muito dopado, impossibilitado de trabalhar, quase sofri um acidente quando estava trabalhando sob o efeito da medicação.
      Em relação aos delírios, alguns é possível reconhecer, outros não, ficamos meio na dúvida. O que faço é analisar detalhadamente a situação em que ocorreram. Por exemplo, quando ouvi uma voz me ameaçando, no momento tive a impressão de que era realidade, mas tempo depois analisando notei que a voz não era de uma pessoa falando alto, já que a pessoa que eu estava avistando estava um pouco distante de mim.
      E vários outros delírios que tive, conto tudo no livro. Caso deseje adquirir abaixo está o link.
      http://memoriasdeumesquizofrenico.blogspot.com.br/2012/08/mente-divida-memorias-de-um.html

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    5. Entendi. E pretendo adquirir o seu livro em pdf.

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